A invenção de Jenner continua a evoluir para que ganhemos a guerra contra vírus, bactérias, cânceres, alérgenos, e muitos outros agressores da nossa saúde.
Um dos grandes desafios no caminho do desenvolvimento de vacinas eficazes e seguras é encontrar um material (um adjuvante) que gere um alerta preciso ao sistema imunitário. Este alerta, passado ao português, pode ser do tipo: "ignore, isso aí não representa ameaça nenhuma", ou "destrua já, mas use anticorpos", ou quem sabe "coloque sentinelas naquela porta de entrada, é por lá que o teu inimigo entra". É aí que mora grande parte do segredo de uma boa vacina. Outra parte do desafio é encontrar a "impressão digital" do inimigo (o antígeno), para que o sistema imunitário exerça apenas sobre o inimigo o que a mensagem de alerta recomendou.
Reunir em um único pacote a impressão digital do inimigo e a mensagem de alerta é um dos melhores artifícios para produzir uma vacina eficaz. As nanopartículas têm sido muito utilizadas para este fim. Com elas é possível colocar o alerta e a impressão digital do inimigo em um único compartimento, em um único "envelope". Além disso, pelo seu tamanho, são capazes de circular fluentemente por diversas barreiras do organismo. Elas podem chegar onde outros não chegam. Elas podem conversar com os atores certos do sistema imunitário.
Neste contexto, os complexos imunoestimulantes, ou ISCOMs, têm sido extensivamente empregados no desenvolvimento experimental de vacinas. Os ISCOMs são nanopartículas de cerca de 35 nm de diâmetro e compostas por diferentes lipídios. A composição lipídica destas nanopartículas faz com que estas assumam uma forma muito peculiar: de gaiolas esféricas nanométricas! Veja a figura abaixo.
ISCOMs: complexos imunoestimulantes. Observe a sua forma de gaiola esférica. A barra preta tem comprimento de 100 nm. (Fonte: McBurney et al, Vaccine 26(2008):4549-4556.) |
Além dessa estrutura de gaiola, o que chama a atenção é o fato de estas nanopartículas apresentarem em sua composição surfactantes de origem vegetal, da classe das saponinas, que são especialistas em ativar o sistema imunitário. Estes surfactantes, cuja mistura é denominada Quil-A, "dizem" ao sistema imunitário que a impressão digital que os acompanha é de um inimigo que deve ser combatido energicamente.
Pesquisas com vacinas contendo ISCOMs vêm sendo realizadas há muitos anos. Dentre os alvos destas vacinas estão vírus como influenza, HIV, HPV, HCV (hepatite C) e HSV (herpes, 1 e 2), além de diversos tipos de câncer. Para se ter uma ideia, uma vacina baseada em ISCOMs contra um vírus influenza, da gripe, chegou a gerar uma resposta imunitária com tempo de memória, i.e., tempo durante o qual a resposta continua a ser exercida contra o vírus após a vacinação, 10 vezes maior que o observado com vacinas convencionais (Warren et al, 2008).
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